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O caso Ford

Isto ocorreu dentro de um mecanismo e um tipo de negociação bastante recorrente entre estados e empresas.

15/09/2023 às 17h14
Por: Pedro Fagundes de Borba
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Olívio Dutra
Olívio Dutra

Dentro da superestrutura e das bases do capitalismo, o que impera com grande força e poder são as empresas, em verdade as multinacionais e as mais formas. As quais se posicionam num espaço acima das outras, ganhando mais poder e espaço. É incorreto dizer que elas derrubam ou substituem o estado. Pois não possuem a estruturação, a posição e os mecanismos do estado. O qual é necessário para a organização e condução social, dando ordem e possibilitando existência e caminhos as suas respectivas sociedades. As grandes companhias não possuem tal formato e poderes. Além do que, historicamente já, existem não apesar do estado, mas por causa do estado. Somente com o estado liberando e organizando, legislando e dando tal forma é que estas conseguem se colocar e se sustentar socialmente. 

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 Por isso o que grandes empresas fazem não é a substituição ou enfraquecimento do estado, mas seu aparelhamento e seu uso para fins próprios, para fortalecimento enquanto empresas. Praticamente todas as grandes empresas do mundo são bastante próximas dos estados, dos seus países de origens e daqueles nos quais atuam. E assim continuam atuando na era das big tecs, das companhias crescendo e dominando mais espaço. Mas fazendo isto a partir de um jogo com o estado, usando suas instituições, mecanismos e poderes. Dentro desta lógica torna-se importante que se conheçam e se façam ações capazes de contrariar isto ou ao menos fazer um jogo, contraponto entre partes para enfrentar tal realidade e condições. Pois se estas ganham bastante poder o estado ainda pode agir e melhorar, dando alguns freios em tais situações. E também reestruturando e ajustando situações determinadas. Permitindo uma afronta aos interesses das gigantes, de acordo com interesses do povo. 

Um caso que ilustra bem tais situações e realidade é o da Ford no Rio Grande do Sul, que, por não aceitar negociações com o estado gaúcho, acabou saindo e indo para outro. No caso, a Bahia. Isto ocorreu dentro de um mecanismo e um tipo de negociação bastante recorrente entre estados e empresas. Que é o de isenções, incentivos e, em alguns sentidos, privilégios que determinadas empresas multinacionais podem ter em um determinado país ou região para que ali se instalem. Normalmente isto serve como maneira da empresa se instalar, fazer suas ações e serviços, empregar parte da população e, em certa medida, enriquecer o país e fortalecer sua estrutura e economia, através do pagamento de impostos e integração com o território. 

Porém, para que isto se concretize corretamente, é preciso haver um bom e forte acordo entre as partes, para que a empresa não consiga o privilégio de simplesmente ocupar um espaço, explorar, ganhar o dinheiro e nada disso ser revertido para o território onde está instalada, indo todo para ao exterior. O jogo com o governo, baseado diretamente no tamanho e poder desta mesma empresa mostra-se necessário para que o primeiro cenário ocorra ao invés do segundo. Para o governo saber como agir e reverter em benefício ao país. Na época em que saiu, a Ford queria ter uma isenção de tempo muito longa e de outros tributos. O que prejudicaria o estado, mantendo apenas uma forte exploração do mesmo.

O então governador Olívio Dutra foi bastante firme em não ceder ao lobby e pressões da mesma para que tal situação não ocorresse. E sim que pudesse ser feita um jogo que fosse benéfico, baseado naquilo que seria revertido. Tal acordo foi aceito pela General Motors, que, aceitando os acordos com o governo, se instalou na cidade de Gravataí, onde está até hoje muito bem. Ali ficou uma coisa melhor montada. Posteriormente, instalada na Bahia, que aceitou suas condições, a Ford também saiu. Não tendo mais no Brasil. Mesmo quem se abriu mais, a montadora não quis, vendo um espaço que não valia a pena para si. Neste ponto, mostram-se as características e ações da empresa de maneira ainda mais viva e crua. 

Olívio então foi alguém que conseguiu enxergar o tipo de acordo e negociação que se queria ali, vendo não ser positivo. Um governador mais fraco teria titubeado e caído, cedendo. Porém, por ser alguém com ampla experiência na política, negociações e lutas brasileiras, o ex bancário soube como agir e quais caminhos estavam tentando tomar. Por eles enveredando, mostrou os problemas que a Ford tentava trazer. Tal conhecimento foi também importante para manter a GM e negociar com eles, fazendo algo mais benéfico. Um ato bastante atacado na época, mas que demonstra um episódio de negociação em que o governo soube manter sua posição e manter o melhor. Nestes casos tais prevalecimentos mostram a força e ações do estado que resultam no jogo com as empresas. E como tais forças carregam as contradições e formas para agir. Um exemplo prático da política e suas possibilidades.   

 

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